Como se Inventaram os Almanaques - Machado de Assis
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Prólogo
Some-te, bibliógrafo! Não tenho nada contigo. Nem contigo, curioso de histórias poentas.
Sumam-se todos; o que vou contar interessa a outras pessoas menos especiais e muito
menos aborrecidas. Vou dizer como se inventaram os almanaques.
Sabem que o Tempo é, desde que nasceu, um velho de barbas brancas. Os poetas não
lhe dão outro nome: o velho Tempo. Ninguém o pintou de outra maneira. E como há quem
tome liberdades com os velhos, uns batem-lhe na barriga (são os patuscos), outros
chegam a desafiá-lo; outros lutam com ele, mas o diabo vence-os a todos; é de regra.
Entretanto, uma coisa é barba, outra é coração. As barbas podem ser velhas e os
corações novos; e vice-versa: há corações velhos com barbas recentes. Não é regra, mas
dá-se. Deu-se com o Tempo. Um dia o Tempo viu uma menina de quinze anos, bela
como a tarde, risonha como a manhã, sossegada como a noite, um composto de graças
raras e finas, e sentiu que alguma coisa lhe batia do lado esquerdo. Olhou para ela e as
pancadas cresceram. Os olhos da menina, verdadeiros fogos, faziam arder os dele só
com fitá-los.