Camões - Joaquim Nabuco
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Prólogo
Quando no dia 10 de Junho de 1580, Luís de Camões expirava em Lisboa, na
mais completa miséria, ao desamparo de todos, abandonado até de si mesmo, se
alguém lhe dissesse que ele só morria para ficar imortal, talvez que o Poeta,
esmagado como o Gladiador pelo seu próprio destino, sem que no vasto Anfiteatro
uma voz, um gesto, um olhar, pedisse compaixão para ele, afastasse com
indiferença essa esperança de uma vida que não é mais do homem, mas tãosomente
do seu gênio e da sua obra.
Entretanto, senhores, por mais que a consciência transforme numa tragédia
pessoal cada um dos nossos sofrimentos, que aos olhos de um espectador
desinteressado que abrangesse o interior de todas as almas, não pareceriam mais
dramáticos do que a queda silenciosa da ave ferida no vôo, o que são todos os
infortúnios reais e verdadeiros do Poeta, comparados à glória que nos reúne a
todos, trezentos anos depois da sua morte, em torno da sua estátua?
O homem é o nome. A parte individual da nossa existência, se é a que mais
nos interessa e comove, não é por certo a melhor. Além desta, há outra que
pertence à pátria, à ciência, à arte; e que, se quase sempre é uma dedicação
obscura, também pode ser uma criação imortal. A glória não é senão o domínio que
o espírito humano adquire dessa parte que se lhe incorpora, e os Centenários são
as grandes renovações periódicas dessa posse perpétua.