Ao Entardecer - Visconde de Taunay
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Prólogo
Em dia fresco e de chuva miuda, viajava eu na estrada de ferro Central.
Vinha de S. Paulo para o Rio de Janeiro em trem que parecia, contra inveterados hábitos,
dever chegar á hora regulamentar.
A locomotiva como que se aprazia a devorar o espaço - na phrase consagrada - por tempo
tão grato que dispensava calor, poeira e grandes atrazos, e o jornadear, calculado por
tabella official de paradas certas, inflexíveis, sempre as mesmas, era relativamente
agradável.
Na estação do Cruzeiro, onde desde largos annos -ia dizendo séculos - imperam o porte
dominados, a alentada bengala, a enérgica gesticulação e as barbas medieváes e
enchumaçadas do major Novaes, entrou uma família, regressando de Caxambú.
Pae, mãe, bastante moços, esta ainda vistosa, bonita, um filho de 12 para 13 annos,
visivelmente doente, duas creadas, uma branca, outra preta, e um molocóte, vestido de
pagem, muitas malinhas de mão, chales, cobertores, travesseiros, garrafas de leite e aguas
mineraes, embrulhos com restos, sem duvida, da matolotagem, comida á descida da serra.
Tudo aquilo ás carreiras se arrumou nos bancos vazios ao lado e ao redor de mim.
Afinal, apitou a machina e partiu o barulhento comboio.
Cançado de ler, exgotados os jornaes de S. Paulo, parcos de novidades, e um tanto
aborrecido com um romance de Charles Merouvel comprado no Garraux, que não me
interessava, nem merecia interesse, puz-me a observar os recem-chegados.
No rosto de todos, a inquietação, concentrada no menino que, apenas sentado, pedira para
se deitar.