Eu, Alex Cross - James Patterson
Sinopse
Numa noite de festa, Alex Cross recebe uma notícia chocante. O detetive está comemorando seu aniversário quando atende a um telefonema informando que sua sobrinha, Caroline Cross, foi brutalmente assassinada. Ele jura que vai capturar o criminoso e logo descobre que Caroline estava envolvida com prostituição e não foi a única vítima. Garotas de um clube privativo desaparecem misteriosamente.
Atrás de pistas do assassino, Alex e a namorada, a detetive Brianna Stone, vão a um lugar onde é possível realizar qualquer fantasia, desde que se conheçam as pessoas certas para entrar. É lá que um homem misterioso e de gosto excêntrico, autodenominado Zeus, sacia seus desejos.
Um mistério que pode abalar o mundo.
Alex e Bree percebem que terão que enfrentar figuras muito importantes, perigosas e bem protegidas, das mais altas esferas da sociedade. E uma coisa é certa: elas farão de tudo para manter seus segredos.
Prólogo
Um
HANNAH WILLIS CURSAVA O SEGUNDO ano da faculdade de direito da Universidade da Virgínia e seu futuro parecia favorável e promissor – exceto, é
claro, pelo fato de ela estar prestes a morrer naquela mata escura, sombria
e sinistra.
Corra, Hannah, dizia a si mesma. Apenas corra. Pare de pensar. Ficar se lamentando e chorando não vai ajudar você agora. Correr talvez ajude.
Ela tropeçou e cambaleou para a frente até suas mãos encontrarem outro
tronco de árvore no qual se agarrar. Apoiou seu corpo dolorido nele, esperando
recuperar as forças para respirar novamente e poder dar outro pique e seguir
mais alguns passos adiante.
Não pare ou você vai morrer nesta mata. É simples assim.
A bala alojada em algum lugar da parte de baixo das suas costas tornava cada
movimento e cada respiração uma agonia, causando mais dor do que Hannah
jamais imaginara possível. Era apenas a ameaça de uma segunda bala ou talvez
algo pior que a mantinha de pé e seguindo em frente.
A mata era quase um breu total. A lua crescente que pairava sobre as copas
cerradas das árvores mal iluminava o chão. As próprias árvores não passavam
de sombras. Era impossível ver os espinhos dos arbustos na vegetação rasteira;
eles perfuravam e cortavam suas pernas até sangrar. A pouca roupa que usava
– apenas um body caro de renda preta – agora pendia em frangalhos dos seus
ombros.
No entanto, nada disso importava ou ao menos era registrado por Hannah.
O único pensamento claro que conseguia atravessar a dor e o pânico era: Corra,
garota. O restante era um pesadelo sem palavras nem sentido.
Por !m e muito de repente – teria se passado uma hora? Ou mais? –, a
cobertura baixa das árvores se abriu acima da sua cabeça e ao seu redor.
– Mas o que...?
A terra se transformou em cascalho debaixo dos seus pés e, sem ter onde se
apoiar, Hannah caiu de joelhos.
Sob o luar opaco, ela conseguia ver o fantasma de uma faixa dupla no asfalto,
revelando a curva de uma estrada. Era como um milagre. Ou meio milagre, pelo
menos. Ela sabia que ainda não tinha escapado daquela encrenca.
Quando ouviu o barulho de um motor ao longe, Hannah se apoiou nas pró-
prias mãos e empurrou o corpo para cima, levantando-se do cascalho. Reunindo
uma força que não sabia ainda possuir, !cou de pé e então cambaleou até o meio
da estrada. Suor e lágrimas embaçavam seu mundo.
Por favor, Deus, não permita que sejam eles. Não podem ser aqueles dois desgraçados.
O Senhor não seria tão cruel, seria?
Foi então que uma caminhonete vermelha dobrou a curva, vindo para cima
dela depressa. Depressa demais! De repente ela estava tão cega quanto estivera
antes na mata, mas dessa vez por causa dos faróis do veículo.
– Pare! Por favor, pare! Por favooor! – gritou ela. – Pare, seu !lho da puta!
No último segundo, os pneus cantaram no asfalto. A caminhonete vermelha
entrou por completo no seu campo de visão e parou imediatamente antes de
atropelá-la como um animal na estrada. Ela conseguia sentir o calor que saía do
motor através da grade.
– Ei, gatinha, bela roupa. Você só precisava ter esticado o polegar.
Ela não conhecia aquela voz – o que era bom, muito bom. Música country
alta vinha da cabine também: Charlie Daniels Band, sua mente registrou de forma vaga, pouco antes de Hannah desabar no asfalto.
O motorista já havia saído da caminhonete quando, segundos depois, ela recobrou a consciência.
– Oh, meu Deus, eu não... O que aconteceu com você? Você está...? O que
aconteceu com você?
– Por favor. – Ela mal conseguia falar. – Se eles me encontrarem aqui, vão
matar nós dois.
As mãos fortes do homem a envolveram, roçando o buraco do tamanho de
uma moeda de 10 centavos nas suas costas enquanto a erguiam. Ela apenas
suspirou, fraca demais para gritar. Alguns segundos nebulosos e indistintos
depois, eles estavam dentro da caminhonete e seguindo muito depressa pela
rodovia de duas pistas.
– Aguente !rme, querida. – A voz do motorista estava trêmula agora. – Me
conte quem fez isso com você.
Hannah sentia que estava perdendo a consciência de novo.
– Os homens...
– Os homens? Que homens, querida? De quem você está falando?
Uma resposta pairou vagamente sobre a cabeça de Hannah e ela não soube ao certo se a disse em voz alta ou se apenas pensou nela antes de tudo
escurecer.
Os homens da Casa Branca.
Dois
O NOME DELE ERA JOHNNY TUCCI, mas todos os garotos do seu bairro no sul da
Filadél!a o chamavam de Johnny Cacoete, por causa do modo como seus olhos
não paravam quietos quando ele !cava nervoso, o que acontecia a maior parte
do tempo.
É claro que, depois dessa noite, os garotos do bairro poderiam ir se danar. Naquela noite Johnny entrou no jogo pra valer. Era hora de ser homem. Ele estava
com “o pacote”, não estava?
Era um serviço simples, mas dos bons, porque ele estava sozinho e precisava
assumir toda a responsabilidade. Já havia apanhado o pacote. Teve medo, mas
se saiu bem.
Ninguém falava com todas as letras, mas, assim que você começava a fazer
entregas desse tipo, isso signi!cava que estava vinculado de alguma forma à
Família e que ela estava vinculada a você. Em outras palavras, havia um relacionamento. Depois daquela noite, Johnny não precisaria mais fazer apostas para
os outros, nem catar migalhas nos bairros do sul. Era como aquele adesivo de
para-choque que dizia: Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida.
Então era natural que ele estivesse empolgado... e só um pouquinho nervoso.
O alerta de seu tio Eddie não parava de se repetir na sua mente, como uma
gravação: Não desperdice essa oportunidade, Cacoete. Estou colocando o meu na
reta por você. O tio dissera isso como se estivesse lhe fazendo um grande favor ao
lhe dar esse serviço. Quer dizer, Johnny até achava que talvez estivesse realmente,
mas mesmo assim. Seu próprio tio não precisava jogar isso na sua cara, precisava?
Ele estendeu a mão e aumentou o volume do rádio. Até a música country que
eles costumavam tocar por ali era melhor do que escutar a falação de Eddie na
sua cabeça a noite inteira. Estava tocando uma velha canção da Charlie Daniels
Band, “"e Devil Went Down to Georgia”. Ele até conhecia um pouco da letra.
Mas nem isso fez com que a voz de Eddie saísse de sua mente.
Não desperdice essa oportunidade, Cacoete.
Estou colocando o meu na reta por você.
Puta merda!
Luzes azuis piscavam em seu retrovisor, vindas do nada. Dois, três segundos
antes ele poderia ter jurado que estava sozinho na Interestadual 95.
Pelo jeito, não.
Johnny começou a sentir os primeiros espasmos no canto do olho direito.
Ele pisou no acelerador; talvez conseguisse fugir. Então se lembrou da porcaria do Dogde que estava dirigindo, roubado do estacionamento de um motel
em Essington. Que droga! Eu devia ter ido ao estacionamento do Marriott. Arranjado um carro japa.
Mas era possível que ainda não tivessem denunciado o roubo do Dodge. O
dono, seja lá quem fosse, provavelmente estava dormindo no motel. Com alguma sorte, Johnny poderia simplesmente sumir com a multa e ninguém jamais
precisaria !car sabendo.
Mas esse era o tipo de sorte que as outras pessoas tinham, não ele.
Os policiais levaram uma eternidade para sair da viatura, o que era um mau
sinal – o pior de todos. Eles estavam conferindo o modelo e a placa do veículo. Quando en!m chegaram ao Dodge, parando um de cada lado, os olhos de
Johnny já pareciam dois feijões saltadores mexicanos.
Ele tentou manter a calma.
– Boa noite, o!ciais. Algum pro...
O que estava do seu lado, um sujeito alto com um sotaque caipira, abriu a
porta do motorista.
– Bico calado. Saia do veículo.
Eles não demoraram nada para encontrar o pacote. Depois de vasculharem
os bancos da frente e de trás, abriram o porta-malas, puxaram a lona que cobria
o estepe e pronto.
– Nossa Senhora! – exclamou um dos policiais ao iluminar o porta-malas
com sua lanterna. O outro engasgou quando viu o que havia ali. – Que diabo
você fez?
Johnny não !cou por perto para responder à pergunta. Ele já estava correndo
para salvar sua vida.
Três
NINGUÉM NUNCA TINHA ESTADO TÃO morto, ou sido tão burro, quanto ele agora. Johnny Tucci teve certeza disso enquanto saía do meio das árvores e começava a descer, deslizando, uma ribanceira que havia ao lado da rodovia.
Ele talvez pudesse se esconder daqueles tiras, mas não da Família. Nem na cadeia nem em qualquer outro lugar. Isso era um fato. Não se perdia um “pacote”
como aquele sem que você mesmo se tornasse um pacote.
Vozes surgiram de cima do barranco, seguidas por fachos de luz dançantes.
Johnny atirou-se no chão e se escondeu debaixo de um aglomerado de arbustos.
Ele tremia dos pés à cabeça, seu coração tão acelerado que chegava a doer, seus
pulmões ofegantes por conta do excesso de cigarros. Era quase impossível !car
parado, em silêncio.
Ai, merda, estou morto.
– Está vendo alguma coisa? Está vendo aquele desgraçado? Aquele doente?
– Ainda não. Mas nós vamos pegá-lo. Ele está aqui embaixo em algum lugar.
Não pode ter ido longe.
Os policiais se dividiram, indo cada um para um lado, descendo a ribanceira.
Muito calculistas e e!cientes.
Embora ele já tivesse conseguido recuperar o fôlego, a tremedeira só piorava,
e não apenas por causa dos tiras. Era porque tinha começado a se dar conta
do que precisaria fazer em seguida. Estritamente falando, havia somente duas
opções realistas. Uma envolvia o 38 que ele trazia no coldre em seu tornozelo.
A outra, o pacote – e seu dono. Era apenas uma questão de como ele preferia
morrer. E, sob aquele luar frio, não parecia haver muita escolha. Movendo-se o
mais lentamente possível, ele estendeu a mão para baixo e sacou o 38. Tremendo
muito, encaixou o cano dentro da boca. A porcaria do metal chacoalhava com
força contra seus dentes e deixava um gosto amargo em sua língua. Ele sentiu
vergonha das lágrimas que escorriam pelo seu rosto, mas não conseguia evitá-
-las. De qualquer maneira, quem além dele !caria sabendo?
Meu Deus, era assim mesmo que iria terminar? Com ele chorando feito um
bebê, sozinho no meio da #oresta? Que mundo terrível.
Ele conseguia até ouvir os garotos falando. Deus me livre de acabar como
Johnny. Johnny Cacoete. Era isso que eles colocariam na sua lápide – só de
crueldade. Aqueles malditos!
Durante todo aquele tempo, o cérebro de Johnny dizia aperte o gatilho, mas
seu dedo não obedecia. Tentou novamente, com as duas mãos no cabo dessa
vez, mas não adiantou. Nem isso ele conseguia fazer direito.
Por !m, cuspiu o cano da arma, ainda chorando como uma criança. De certa
maneira, saber que iria viver mais um dia não o ajudou nem um pouco a conter
as lágrimas. Ele apenas !cou deitado ali, mordendo os lábios, sentindo pena de
si mesmo, até os tiras chegarem ao córrego no fundo da ribanceira.
Então Johnny Cacoete escalou rapidamente o mesmo caminho pelo qual
havia descido, atravessou a interestadual e se jogou na mata do outro lado –
perguntando-se como faria para sumir da face da Terra, mas sabendo que isso
era totalmente impossível.
Ele havia olhado. Tinha visto o que estava dentro do “pacote”.