Contos Fora da Moda - Artur Azevedo
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Sinopse
A lisonjeira aceitação que tiveram os Contos Possíveis, anima-me a publicar
os Contos Fora de moda. Intitulei-os assim, porque sou o primeiro a reconhecer que
eles estão inteiramente afastados do atual movimento literário, isto é, foram escritos
sem preocupação de psicologia nem ginástica de estilo. Dá que tos ofereça como
uma prova insignificante, mas sincera, não só da velha amizade que te consagro,
como da consideração em que tenho o teu caráter e o teu talento. (1893, Artur
Azevedo)
A primeira edição deste livrinho de literatura amena logrou um êxito com que
eu não contava. O editor comunicou-me que em menos de um mês desapareceram
todos os exemplares expostos à venda, e a imprensa não foi menos generosa que o
público.
Apenas um jornalista agrediu a obra, mas esse mesmo fechava com as
seguintes palavras o seu artigo de crítica: “De resto, como simples obra recreativa,
os Contos fora de moda têm seu valor especial.”
Como outro não foi o meu intento senão fazer uma “simples obra recreativa”,
bastava essa declaração de uma pena insuspeita para que eu autorizasse esta
segunda edição.
Prólogo
O VIÚVO
Na véspera de partir para a Europa, o doutor Claudino, sem prever o fúnebre
espetáculo de que ia ser testemunha, foi despedir-se do seu velho camarada
Tertuliano.
Ao aproximar-se da casa, ouviu berreiro de crianças e mulheres, e a voz de
Tertuliano, que dominava de vez em quando o alarido geral, soltando, num tom
estrídulo e angustioso, esta palavra: “Xandoca.”
O doutor Claudino apressou o passo, e entrou muito aflito em casa do amigo.
Havia, efetivamente, motivo para toda aquela manifestação de desespero.
Tertuliano acabava de enviuvar. Havia meia hora que dona Xandoca, vítima de uma
febre puerperal, fechara os olhos para nunca mais abri-los.
O corpo, vestido de seda preta, as mãos cruzadas sobre o peito, estavam
colocado num canapé, na sala de visitas. À cabeceira, sobre uma pequena mesa
coberta por uma toalha de rendas, duas velas de cera substituíam, aos dois lados de
um crucifixo, o bom e o mau ladrão.
Tertuliano, abraçado ao cadáver, soluçava convulsivamente, e todo o seu
corpo tremia como tocado por uma pilha elétrica. Os filhos, quatro crianças, a mais
velha das quais teria oito anos, rodeavam-no aos gritos.