A Chave - Machado de Assis
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Prólogo
Não sei se lhes diga simplesmente que era de madrugada, ou se comece num tom mais
poético: aurora, com seus róseos dedos... A maneira simples é o que melhor me conviria
a mim, ao leitor, aos banhistas que estão agora na Praia do Flamengo — agora, isto é, no
dia 7 de outubro de 1861, que é quando tem princípio este caso que lhes vou contar.
Convinha-nos isto; mas há lá um certo velho, que me não leria, se eu me limitasse a dizer
que vinha nascendo a madrugada, um velho que... degamos quem era o velho.
Imaginem os leitores um sujeito gordo, não muito gordo — calvo, de óculos, tranqüilo,
tardo, meditativo. Tem sessenta anos: nasceu com o século. Traja asseadamente um
vestuário da manhã; vê-se que é abastado ou exerce algum alto emprego na
administração. Saúde de ferro. Disse já que era calvo; equivale a dizer que não usava
cabeleira. Incidente sem valor, observará a leitora, que tem pressa. Ao que lhe replico que
o incidente é grave, muito grave, extraordinariamente grave. A cabeleira devia ser o
natural apêndice da cabeça do major Caldas, porque cabeleira traz ele no espírito, que
também é calvo.