História Comum - Machado de Assis
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Prólogo
...Caí na copa do chapéu de um homem que passava... Perdoe-me este começo; é um
modo de ser épico. Entro em plena ação. Já o leitor sabe que caí, e caí na copa do
chapéu de um homem que passava- resta dizer donde caí e por que caí.
Quanto à minha qualidade de alfinete, não é preciso insistir nela. Sou um simples alfinete
vilão, modesto, não alfinete de adorno, mas de uso, desses com que as mulheres do povo
pregam os lenços de chita, e as damas de sociedade os fichus, ou as flores, ou isto, ou
aquilo. Aparentemente vale pouco um alfinete; mas, na realidade, pode exceder ao
próprio vestido. Não exemplifico; o papel é pouco, não há senão o espaço de contar a
minha aventura.
Tinha-me comprado uma triste mucama. O dono do armarinho vendeu-me, com mais
onze irmãos, uma dúzia, por não sei quantos réis; cousa de nada. Que destino! Uma triste
mucama. Felicidade,— este é o seu nome,—pegou no papel em que estávamos
pregados, e meteu-o no baú. Não sei quanto tempo ali estive; saí um dia de manhã para
pregar o lenço de chita que a mucama trazia ao pescoço. Como o lenço era novo, não
fiquei grandemente desconsolado. E depois a mucama era asseada e estimada, vivia nos
quartos das moças, era confidente dos seus namoros e arrufos; enfim, não era um destino
principesco, mas também não era um destino ignóbil.