História de Quinze Dias - Machado de Assis
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Prólogo
Dou começo à crônica no momento em que o Oriente se esboroa e a poesia parece expirar às mãos
grossas do vulgacho. Pobre Oriente! Mísera poesia!
Um profeta surgiu em uma tribo árabe, fundou uma religião, e lançou as bases de um império; império e
religião têm uma só doutrina, uma só, mas forte como o granito, implacável como a cimitarra, infalível
como o Alcorão.
Passam os séculos, os homens, as repúblicas, as paixões; a história faz-se dia por dia, folha a folha; as
obras humanas alteram-se, corrompem-se, modificam-se, transformam-se. Toda a superfície civilizada da
terra é um vasto renascer de coisas e idéias. Só a idéia muçulmana estava de pé; a política do Alcorão
vivia com os paxás, o harém, a cimitarra e o resto.
Um dia, meia dúzia de rapazes libertinos iscados de João Jacques e de Benjamim Constant, ainda quentes
do último discurso de Gladstone ou do mais recente artigo do Courrier de l'Europe; meia dúzia de
rapazes, digo eu, resolveram dar com o monumento bizantino em terra, abrir o ventre ao fatalismo e
arrancar de lá uma carta constitucional
Pelas barbas do Profeta! Há nada menos maometano do que isto? Abdul-Aziz, o último sultão ortodoxo,
quis resistir ao 89 turco; mas não tinha sequer o exército, e caiu; e, uma vez caído, deitou-se da janela da
vida à rua da eternidade.