Médico é Remédio - Machado de Assis
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Prólogo
Em que diabo conversam estas duas moças metidas na alcova? Conversam do Miranda,
um rapaz engenheiro, que vai casar com uma amiga delas. Este Miranda é um noivo
como qualquer outro, e não inventou o quadrado da hipotenusa; é bonito, mas não é um
Apolo. Também não é rico. Tem mocidade, alguma instrução e um bom emprego. São
vantagens, mas não explicam que as duas moças se fechem na alcova para falar dele, e
muito menos que uma delas, a Julieta, chore às bandeiras despregadas.
Para compreender ambas as coisas, e principalmente a segunda, é preciso saber que o
nosso Miranda e Julieta amaram-se algum tempo. Pode ser mesmo que ele não a
amasse; ela é que com certeza morria por ele. Trocaram muitas cartas, as dele um pouco
secas como um problema, as dela enfeitadas de todos os retalhos de frases que lhe
lembravam dos romances. Creio mesmo que juraram entre si um amor eterno, não
limitado à existência do sol, no máximo, mas eterno, eterno como o próprio amor. Vai
então o miserável, aproveita-se da intimidade de Julieta com Malvina, namora a Malvina e
pede-a em casamento. O que ainda agrava este fato é que Malvina não tinha melhor
amiga que Julieta; andaram no colégio, eram da mesma idade e trocavam as suas mais
íntimas confidências. Um dia Julieta notou certa frieza na outra, escassez de visitas,
poucas cartas; e tão pouco advertiu na causa que, achando também alguma diferença no
Miranda, confiou à amiga as suas tristezas amorosas. Não tardou, porém, que a verdade
aparecesse. Julieta disse à amiga coisas duras, nomes feios, que a outra ouviu com a
placidez que dá a vitória, e perdoou com magnanimidade. Não é Otávio o demente, é
Augusto.