Uma Senhora - Machado de Assis
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Prólogo
Nunca encontro esta senhora que me não lembre a profecia de uma lagartixa ao
poeta Heine, subindo os Apeninos: "Dia virá em que as pedras serão plantas, as plantas
animais, os animais homens e os homens deuses." E dá-me vontade de dizer-lhe: — A
senhora, D. Camila, amou tanto a mocidade e a beleza, que atrasou o seu relógio, a fim de
ver se podia fixar esses dois minutos de cristal. Não se desconsole, D. Camila. No dia da
lagartixa, a senhora será Hebe, deusa da juventude; a senhora nos dará a beber o néctar da
perenidade com as suas mãos eternamente moças.
A primeira vez que a vi, tinha ela trinta e seis anos, posto só parecesse trinta e dois,
e não passasse da casa dos vinte e nove. Casa é um modo de dizer. Não há castelo mais
vasto do que a vivenda destes bons amigos, nem tratamento mais obsequioso do que o que
eles sabem dar às suas hóspedes. Cada vez que D. Camila queria ir-se embora, eles pediamlhe
muito que ficasse, e ela ficava. Vinham então novos folguedos, cavalhadas, música,
dança, uma sucessão de coisas belas, inventadas com o único fim de impedir que esta
senhora seguisse o seu caminho.