Pareceres de Machado de Assis - Machado de Assis
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Prólogo
Clermont ou A mulher do artista é uma dessas banalidades literárias que
constituem por aí o repertório quase exclusivo dos nossos teatros.
A bem dizer não é um drama, é uma narração fria, fastidiosa, trivial, onde a
luta dos sentimentos é nula, e onde nada existe do que pode constituir um drama.
Se a peça nada vale por si, a tradução veio torná-la mais inferior ainda se é
possível. Não só a construção da frase portuguesa se ressente do idioma original,
mas ainda há vocábulos disparatadamente traduzidos. Entre outros, ocorre-me o
verbo demander – traduzido na acepção de pedir, em vez de perguntar, que é a que
cabe na ocasião (cena 6ª do 2º ato); e a palavra repétition – traduzida repetição, em
vez de ensaio, como convinha. E outras, e outras.
Pena é que os nossos teatros se alimentem de composições tais, sem a menor
sombra de mérito, destinadas a perverter o gosto e a contrariar a verdadeira missão
do teatro. Compunge deveras um tal estado de coisas a que o governo podia e devia
pôr termo iniciando uma reforma que assinalasse ao teatro o seu verdadeiro lugar.
Bem severo é Ulbach, bem severo é Montégut, invectivando o teatro
contemporâneo francês, mas quanto são cabidas as suas censuras ao nosso país, em
cujo teatro se legitimam as versões espúrias e mal alinhavadas de quanta
fraudulagem, de quanta ruindade desonra o teatro estrangeiro!