As Bodas de Luís Duarte - Machado de Assis
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Prólogo
Na manhã de um sábado, 25 de abril, andava tudo em alvoroço em casa de José lemos.
Preparava-se o aparelho de jantar dos dias de festa, lavavam-se as escadas e os corredores, enchiamse
os leitões e os perus para serem assados no forno da padaria defronte; tudo era movimento;
alguma coisa ia acontecer nesse dia.
O arranjo da sala ficou a cargo de José Lemos. O respeitável dono da casa, trepado num
banco, tratava de pregará parede duas gravuras compradas na véspera em casa do Bernasconi; uma
representava a Morte de Sardanapalo; outra a Execução de Maria Stuart. Houve alguma luta
entre ele e a mulher a respeito da colocação da primeira gravura. D. Beatriz achou que era indecente
um grupo de homens abraçado com tantas mulheres. Além disso, não lhe pareciam próprios dois
quadros fúnebres em dia de festa. José lemos, que tinha sido membro de uma sociedade literária,
quando era rapaz, respondeu triunfantemente que os dois quadros eram históricos. E que a história
está bem em todas as famílias. Podia acrescentar que nem todas as famílias estão bem na história;
mas este trocadilho era mais lúgubre que os quadros.
D. Beatriz, com as chaves na mão, mas sem a melena desgrenhada do sonêto de Tolentino,
andava literalmente da sala para a cozinha, dando ordens, apressando as escravas, tirando toalhas e
guardanapos lavados e mandando fazer compras, em suma, ocupada nas mil coisas que estão a
cargo de uma dona de casa, máxime num dia de tanta magnitude.
De quando em quando, chagava Dona Beatriz à escada que ia ter ao segundo andar, e gritava:
– Meninas, venham almoçar!
Mas parece que as meninas não tinham pressa, porque só depois das nove horas acudiram ao
oitavo chamado da mãe, já disposta a subir ao quarto das pequenas o que era verdadeiro sacrifício
da parte de uma senhora tão gorda.